I
basil hallward, um pintor cuja obra passaria despercebida ao resto do mundo caso, um dia, o destino não o tivesse feito cruzar-se com dorian, que se tornou o seu melhor amigo e a fonte de inspiração da melhor obra da sua vida - o retrato de dorian gray - cuja qualidade ultrapassou largamente tudo o que tinha pintado até então.II
elefante violeta.
viro as tuas folhas ao contrário, não preciso de as ler para saber que estás presente.
então caminho. vagueio por onde caminho. disperso-me por onde vagueio.
há demasiadas promessas em cada rua.
caminho sobre sonhos; um atrás do outro, calcado, recalcado, ignorado, deixado para trás.
entro numa loja de clichés e deparo com uma frase tua na zona dos saldos.
levas-me à loucura nessa tua maneira demente de ser. abro a gaveta do meio, aquela com os remédios, pego na caixa que diz «para o caso de ela voltar». está vazia. merda.
nada a fazer. tombado sobre o chão, deixo correr o correr dos dias, imóvel e esvaziado de pensamentos - sou um vegetal.
e vegetando consolido, ganho raízes, ganho forma. um dia, ergo-me, por fim.
desço a minha própria montanha, misturo-me entre pessoas e venenos. vivo. olho no espelho, o reflexo é vazio de conteúdo mas sinto ter encontrado o mundo na palma da mão. sorrio, tal e qual nietzsche quando se achou super-homem, é agora uma certeza inquebrantável: enlouqueci.
nesse momento, sei que estou pronto a voltar. viro as folhas para a sua posição original. leio-te em cada linha, dou-te a mão no último ponto final.
nada mais a fazer. na saúde e na demência, amo-te.
e assim foi. o quadro ficou, durante anos, tapado por um lençol, fechado num sotão, simultaneamente escondido e ignorado.
um dia, porém, ao se aperceber das mudanças na alma do seu melhor amigo e fonte de inspiração, ao ver até que ponto ele tinha passado de jovem ingénuo a amoral, a sua vontade subitamente mudou.
quis recuperar a sua obra, expô-la, expôr-se a si próprio e ao seu amigo que entretanto tinha-se tornado tudo excepto o seu amigo.
mas embora não o soubesse, era já demasiado tarde para tudo.
viro as tuas folhas ao contrário, não preciso de as ler para saber que estás presente.
então caminho. vagueio por onde caminho. disperso-me por onde vagueio.
há demasiadas promessas em cada rua.
caminho sobre sonhos; um atrás do outro, calcado, recalcado, ignorado, deixado para trás.
entro numa loja de clichés e deparo com uma frase tua na zona dos saldos.
levas-me à loucura nessa tua maneira demente de ser. abro a gaveta do meio, aquela com os remédios, pego na caixa que diz «para o caso de ela voltar». está vazia. merda.
nada a fazer. tombado sobre o chão, deixo correr o correr dos dias, imóvel e esvaziado de pensamentos - sou um vegetal.
e vegetando consolido, ganho raízes, ganho forma. um dia, ergo-me, por fim.
desço a minha própria montanha, misturo-me entre pessoas e venenos. vivo. olho no espelho, o reflexo é vazio de conteúdo mas sinto ter encontrado o mundo na palma da mão. sorrio, tal e qual nietzsche quando se achou super-homem, é agora uma certeza inquebrantável: enlouqueci.
nesse momento, sei que estou pronto a voltar. viro as folhas para a sua posição original. leio-te em cada linha, dou-te a mão no último ponto final.
nada mais a fazer. na saúde e na demência, amo-te.
agosto 2007.
basil espantou todos os seus amigos mais chegados quando confessou a vontade de não expôr a sua melhor obra em qualquer galeria, em qualquer lugar. apesar de o modelo ser dorian, o pintor acreditava que era sua própria alma que se encontrava retratada naquele quadro ou, nas suas palavras mais contidas, «aquele quadro contém muito de mim mesmo».III
e assim foi. o quadro ficou, durante anos, tapado por um lençol, fechado num sotão, simultaneamente escondido e ignorado.
um dia, porém, ao se aperceber das mudanças na alma do seu melhor amigo e fonte de inspiração, ao ver até que ponto ele tinha passado de jovem ingénuo a amoral, a sua vontade subitamente mudou.
quis recuperar a sua obra, expô-la, expôr-se a si próprio e ao seu amigo que entretanto tinha-se tornado tudo excepto o seu amigo.
mas embora não o soubesse, era já demasiado tarde para tudo.
IV
o teu nome é elefante violeta. ou outra coisa qualquer daquelas que estes anos me tenham ensinado a chamar-te. dei o teu nome a algumas palavras que escrevi há dois verões. mas não é como se pretendê-se que elas fossem o teu retrato - nunca o foram. ao lê-las nem sequer me passa pela cabeça que contenham muito de mim, contêm um pouco, isso sim, não to consigo negar de uma forma que seja sincera.
retirei-as daquele bloco da moleskine, de capa preta, versão «pocket». aquele que jamais me passou pela cabeça mostrar-to, e que achava que nunca que me iria passar nem pelo cú a ideia de um dia partilhá-lo num blog.
os tempos talvez não mudem, mas mudam-nos. basil mudou de ideias e eu, bem, eu cá estou.
nunca me vou esquecer da noite em que o bob dylan nos disse para não pensarmos duas vezes. mas esquece o «don't», ele não o disse directamente para nós, concentra-te no «think twice, it's alright». bem devias saber que é o que tenho feito.
ainda não é tarde demais seja para o que for.
daqui a umas horas vai ser manhã, vai estar frio mas o sol vai brilhar como eu já não via há alguns meses.
o teu nome é elefante violeta. ou outra coisa qualquer daquelas que estes anos me tenham ensinado a chamar-te. dei o teu nome a algumas palavras que escrevi há dois verões. mas não é como se pretendê-se que elas fossem o teu retrato - nunca o foram. ao lê-las nem sequer me passa pela cabeça que contenham muito de mim, contêm um pouco, isso sim, não to consigo negar de uma forma que seja sincera.
retirei-as daquele bloco da moleskine, de capa preta, versão «pocket». aquele que jamais me passou pela cabeça mostrar-to, e que achava que nunca que me iria passar nem pelo cú a ideia de um dia partilhá-lo num blog.
os tempos talvez não mudem, mas mudam-nos. basil mudou de ideias e eu, bem, eu cá estou.
V ( ou, talvez, ps: )
nunca me vou esquecer da noite em que o bob dylan nos disse para não pensarmos duas vezes. mas esquece o «don't», ele não o disse directamente para nós, concentra-te no «think twice, it's alright». bem devias saber que é o que tenho feito.
ainda não é tarde demais seja para o que for.
daqui a umas horas vai ser manhã, vai estar frio mas o sol vai brilhar como eu já não via há alguns meses.