6 de outubro de 2012

Um viajante...


Entrara como se vento fosse e passou por mim sem que desse por ele. Era assim o velho coronel, acostumara-se a ser furtivo nos seus tempos de guerra e não gostava que ninguém desse conta de quando entrava e saía. O que fazia no seu quarto, até hoje o não sei, apenas que por lá permanecia durante horas a fio e nem um pio se ouvia. Assim que o sino da igreja dava as seis horas voltava a sair da mesma forma como entrara, veloz e sorrateiro. Um certo dia tentei segui-lo à distância para perceber o que aquele velho tanto tentava esconder. Esperei fora da casa pelo sino que dava as seis horas. À hora marcada, lá saiu o coronel, com um passo tão vagaroso que me parecia surreal que pudesse passar por mim todos os dias sem que desse por isso. Encetei a marcha, tentei ser um com a natureza e cada passo que dava coincidia com o assobiar do vento. Consegui segui-lo sem problemas durante os primeiros duzentos metros, até à enorme praça da cidade. Chegado à praça começou a agir de forma peculiar, quase como se soubesse que estava a ser seguido, ainda que até hoje tenho a certeza que nunca deu pela minha presença; olhava para todos os lados excepto para o meu. Parou em tudo o que era loja para ficar a admirar o seu recheio, ainda que o recheio de algumas dessas lojas fosse tão inadequado como uma de lingerie, na qual tomou largos minutos contemplando, quase como se estivesse a ler um jornal desportivo.
                Assim que estávamos prestes a deixar a praça, e eu a descobrir o caminho que tomava, desapareceu. Sim, como o fumo da chávena de café desaparece assim que atinge certa altura. Não digo que fosse magia ou que o coronel fosse qualquer espécie de bruxo, mas esta verdade que conto é a mais pura delas. Percorri toda a praça, todos os caixotes, revirei-os. Entrei em todas as lojas, em todas as lojas perguntei se o tinham visto. Em todas elas a mesma estranha resposta: “Não sei de quem fala senhor, por cá não passa nenhum simples militar quanto mais um velho coronel”. Pensei para comigo que seria apenas coincidência, que não o viam porque simplesmente não era hábito seu olharem para a rua procurando mirones, daqueles que olham interminavelmente para no fim nada comprarem ou sequer entrarem na loja. Continuei a minha busca, desta feita percorri todos os caminhos que ligavam à praça, pesquisando qualquer possível pista dele, mas nada. Três horas volvidas, voltei para casa, o coronel estava novamente no seu quarto. Ao ouvir o ranger da porta de entrada, saiu do seu quarto e perguntou-me onde havia estado, fazia horas que me procurava e não me encontrava. Queria o seu leite com chá; hábito adquirido com um seu velho amigo 

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